quarta-feira, 13 de junho de 2007

Pais, filhos e peixes.

Gabriel não sabia o que dar ao filho na data do seu aniversário. Estava desempregado há 4 meses. Fora despedido de seu último emprego por justa causa: assediou uma colega de trabalho.

O que dar para um garoto de 14 anos que já tem de tudo? Rubens, seu filho, já tinha tudo que alguém podia querer: carinho, afeto, respeito, uma mãe amorosa, um padrasto compreensivo e que tinha plenas condições de comprar um bom presente para seu enteado.

A primeira coisa que passou pela sua cabeça foi um peixe. Mas seria um bom presente? Gabriel sempre admirou o grande aquário que enfeitava a sala principal de sua falecida tia. Tia Lurdes limpava o aquário toda a semana.

- Na sujeira, ninguém pode ser feliz - era o que dizia para todo mundo.

Fazem quatro meses que Gabriel concorda com ela. Sua casa exala um cheiro de podre que dobra o quarteirão. Ele nem ao menos sabe da onde vem o cheiro. Pode ser da roupa que não é lavada a várias semanas, ou da pia cheia de pratos esperando uma boa esponja de aço que lhes faça justiça, ou ainda do banheiro que ele não dar descarga há exatas três semanas, quando sua água foi cortada.

Ele não gostava de como estava a sua vida. Tinha certeza que seria apenas uma fase. Uma fase um tanto longa, admitia.

Enquanto seu pai tentava escolher o melhor presente, Rubens ria. Ria aquela risada dos 14 anos. Iria fazer 15. Esperou tanto tempo por isso. Sim, quinze anos. Quinze anos e já tinha dado o seu primeiro beijo.

O primeiro beijo de Rubens aconteceu a exatas 13 horas daquele dia. Foi com a Fernanda. Ela era 2 anos mais velha que ele. Foi um beijo roubado, mas bem roubado. No primeiro segundo sentiu um pouco de nojo, mas depois foi melhorando. Melhorando cada vez mais. Quis testa-la: enquanto se beijavam, afastava lentamente a cabeça, só para ver se Fernanda seguia. E ela assim fazia.

Feliz e a poucas horas do seu "níver", Rubens nem sabia da existência de Calvin.

Mas quem era Calvin?

Calvin era um lindo peixe prateado que descansava em seu imenso aquário. Nunca conhecera o mar. Tão pouco sabia o que era. Mas sentia que existia um lugar maior do que aquele em que se encontrava. Um lugar que poderia gozar da verdadeira liberdade.

Calvin não sabia o significado da palavra liberdade. Ele nasceu peixe.

Valdemar era o dono de uma loja de animais. Foi ele que batizou o lindo peixinho prateado acima apresentado. Batizava todos o peixes. Curiosamente, tinha um Pastor-alemão chamado: Sem-nome.

Valdemar tinha sentido pena de pouca gente nesses 49 anos de existência. Sentiu pena de Gabriel. Aquele sujeito baixo, de cabelo amarelado, pele também amarelada, só podia estar doente, ou pior: desempregado.


continua....

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